Na Eucaristia celebramos a vida de Deus e a nossa vida. Deus é santo e fonte de santidade. Pelo batismo ele nos santificou, confiando-nos seu projeto. Celebrar a memória de todos os Santos é olhar para nossa caminhada eclesial.
Mt 5, 1-12a: A felicidade dos pobres. As bem-aventuranças marcam, no Evangelho de Mateus, o início do Sermão da Montanha, a nova constituição do povo de Deus.
O v.1 mostra a quem se destina essa boa nova: às multidões vindas da Síria, Galiléia, Décapole, Jerusalém…Há gente de todos os lugares. Isso significa que a mensagem de Jesus é para todos. Vendo às multidões, Jesus sobe a montanha, que, simbolicamente, é o lugar de Deus e do encontro com ele. A montanha recorda o Sinai, o monte onde a aliança foi selada, a Moisés. Jesus vai inaugurar a Nova Aliança com os pobres e marginalizados do mundo inteiro.
a) A felicidade dos pobres (VV. 3.10). A primeira e última bem-aventurança: “Felizes os pobres em espírito, porque deles é o reino do céu” (v.3), juntamente com a oitava: “Felizes os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino do céu”(v.10), são a síntese de todas as bem-aventuranças. As demais (VV 4-9) esclarecem alguns aspectos dessas duas. As demais bem-aventuranças trazem uma promessa futura: serão consolados, possuirão a terra etc…
A palavra pobre recorda os anawim do AT, da época de Jesus. São os que depositaram sua confiança em Deus enquanto ultima instância, porque a sociedade lhes negava justiça. São pobres em espírito, ou seja, escolheram a pobreza não porque a miséria os fizesse felizes, mas porque nessa condição participam do projeto de Deus, que é a construção da nova sociedade, baseada na justiça e igualdade. A sociedade estabelecida, ambiciosa de poder, glória e riqueza (4,9), não suporta uma sociedade alternativa que se forma com base na partilha e na comunhão dos bens.
b) A situação dos pobres que buscam a libertação (VV.4-6). Os versículos descrevem a situação dos pobres que buscam a libertação. Eles são afligidos. Os aflitos são pessoas cativas e aprisionadas, vítimas de sociedade cruel e opressora. Os mansos são os que foram subjulgados pelos poderosos. Jesus proclama a felicidade dos que lutam pela justiça, dos que dela sentem necessidade como alimento vital e diário, porque na utopia do reino não há um sinal sequer de injustiça.
c) Opções e práxis dos pobres: construir a nova sociedade (VV.7-9). Os pobres, que entram na dinâmica do reino, são misericordiosos, isto é, solidários. Partilha e comunhão impedem que alguém retenha qualquer coisa para si. Nesse clima de solidariedade, ninguém passa necessidade. Quem dá recebe, não só das pessoas, mas do próprio Deus. Por em comum é a primeira opção nos que entram na dinâmica do reino. A , segunda é a pureza de coração. Ser puro de coração é ter conduta única, em perfeita sintonia com o reino. Os pobres do reino são puros de coração porque não se apropriam da vida do próximo, como os poderosos. Sua conduta é íntegra. Jesus proclama felizes os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. A promoção da paz é fruto da solidariedade e pureza de coração.
d) A comunidade cristã em meio aos conflitos (VV.11-12). A última bem-aventurança revela as tensões e conflitos enfrentados pelas comunidades. O evangelho lhes lembra que ser discípulo de Jesus é ser como os profetas do AT: “Desse modo perseguiram os profetas que vieram antes de vocês” (v.12).
1 Jo 3,1-3: A esperança que anima e purifica. Não é possível amar a Deus sem amar ao próximo e sem formar comunidade: se Deus é Pai, os homens são filhos e família de Deus, e consequentemente todos devem amar-se como irmãos”. Viver como filhos de Deus implica a prática de justiça: “todo aquele que pratica a justiça nasceu de Deus” ( 2,29). A prática da justiça mostra que Deus é justo e nos torna seus filhos. Portanto, ser filho de Deus é estar em sintonia com o projeto do Pai. O texto salienta que o amor do Pai é a grande força que sustenta a caminhada da comunidade cristã, apoiando e encorajando a luta pela implantação do projeto de Deus. Os cristãos porém, têm condições de superar as dificuldades e conflitos da caminhada. Sua força está em serem filhos de Deus.
Ap 7,2-4.9-14: A vitória dos oprimidos. Num primeiro momento, abre-se uma janela em direção ao passado (VV.4-8). O autor do Apocalipse se inspira no recenseamento dos hebreus saídos do Egito (Nm 1,20-43) para mostrar que Deus preserva do julgamento aqueles que lhes são fiéis e os salva. No segundo momento se abre a janela para o presente/futuro da comunidade cristã (VV. 9-17). Se, no passado, Israel foi salvo da escravidão egípcia, com maior razão agora o Cordeiro salvará, conduzirá os que permanecem fiéis, enxugando-lhes as lágrimas. (Fazer justiça). Por isso o autor vê uma multidão que ninguém podia contar: gente de todas as nações, tribos, povos e línguas. O apocalipse foi escrito para animar comunidades perseguidos até a morte pela opressão e repressão do império romano. A vitória do Cristo sobre as forças do mal e a memória dos mártires das comunidades devolveram aos cristãos a força própria de sua vocação: a capacidade de denunciar e resistir a todo poder absolutizado que oprime e mata. Os mártires são vitoriosos e estão com Cristo: cabe a nós resistir e lutar.
A festa de Todos os Santos é momento oportuno para uma revisão da caminhada da comunidade. Olhando para os que nos precederam, santos e mártires, a comunidade é convidada a se questionar sobre seu caminho de santidade