Testemunhar o Incrível
“Duelam forte e mais forte é a vida que vence a morte”. A vida é mais forte. O amor supera e vence a morte. O silêncio da vigília pascal está grávido de aleluia. Os que creem em Cristo já podem preparar a festa, como as mulheres que, ao contemplar de longe o lugar em que depositaram o corpo de Jesus, teimavam em crer que a vida é mais forte, e foram premiadas por sua fé e coragem. Nosso último inimigo foi vencido. As portas da vida que não termina foram abertas pelo primogênito dentre os mortos, a brilhante estrela da manhã.
Gêneses 1,1-31: A criação – A narrativa da criação não é um tratado científico, mas um poema que contempla o universo como criatura de Deus. Foi escrito pelos sacerdotes no tempo do exílio na Babilônia (586-538 a.C.) e procura salientar vários pontos. Primeiro, que existe um único Deus vivo e criador. Segundo, que a natureza não é divina, nem está povoada por outras divindades. Terceiro, que o ponto mais alto da criação é a humanidade: homem e mulher, ambos criados à imagem e semelhança de Deus. E a humanidade é chamada a dominar e a transformar o universo, participando da obra da criação. Quarto, que o ritmo da vida é trabalho e descanso: assim como Deus descansou do trabalho criador, também o homem tem direito ao dia semanal de descanso. Importante notar que a criação toda é marcada pelo selo de Deus: «era bom… muito bom».
Gêneses 22,1-18: Sacrifício de Isaac- Deus tira todas as seguranças de Abraão, para lhe fazer sua promessa e entregar-lhe seu dom (cf. Gn 12,1-9 e nota). Muitos obstáculos parecem tornar impossível a realização desse dom e promessa (velhice, esterilidade). Quando a promessa começa a cumprir-se com o nascimento de Isaac, Abraão poderia acomodar-se e perder de vista o grande projeto, para o qual Deus o chamara. Por isso, Deus lhe pede um novo ato de fé que confirme sua obediência. Deus não promete nova segurança para o homem se acomodar; pelo contrário, desafia o homem a estar sempre alerta, a fim de relacionar-se com Deus e criar uma nova história. Só assim o projeto de Deus não será confundido com as limitações dos projetos humanos.
Êxodo 14,15-15,1: Passagem do Mar Vermelho,15-15,1: passagem do mar
– A passagem do mar Vermelho traça uma linha divisória entre o mundo da opressão e o mundo da liberdade. Todo movimento de libertação, que já tenha alcançado suas primeiras metas, corre o perigo de ser cooptado ou sufocado pelos antigos opressores. Javé age não somente para que a libertação seja realizada, mas também impede que o opressor reconduza os libertados para a escravidão.
Trata-se de um hino a Javé guerreiro, celebrando sua vitória sobre as forças que ameaçam o seu povo
Isaias 54,5-14: Renovação das núpcias de Javé com Israel. O profeta descreve a Jerusalém restaurada: a libertação faz surgir a esperança de uma nova era, quando Deus e o povo estarão unidos por uma aliança, como no matrimônio. Essa imagem ideal de uma cidade perfeita e esplendorosa é a utopia que incentiva e orienta o desejo dos homens por uma sociedade justa e fraterna. A imagem reaparecerá em Ap 21-22.
Baruc 3,9-15.32-38 Israel deve voltar à fonte da sabedoria, Deus –Exilado, o povo perdeu o sentido da vida e já parece partilhar o destino dos mortos. A sabedoria é o aprendizado que vem da própria experiência. O povo deve meditar em seus fracassos e aprender que estes são fruto do abandono de Deus, fonte de sabedoria que leva à vida. A prudência é a arte de discernir o momento para a ação oportuna.
Somente Deus, fonte e fim da vida, conhece a sabedoria que conduz o homem à liberdade e à vida; nenhum homem pode alcançá-la. Ela é dom de Deus que exige do homem abertura e acolhimento. Como em Eclo 24, a sabedoria é identificada com a Lei; mas a Lei aqui não se refere apenas aos mandamentos, e sim a todo o Pentateuco; este, para Israel, contém a suprema orientação da vida.
Romanos 28,1-10: Batismo: morrer e coressuscitar com Cristo; o Homem novo – Uma vez para sempre, Cristo morreu e ressuscitou. Sua vida é de Deus. Nesta realidade somos integrados pelo batismo. Deus nos deu tudo por ele e com ele. Mas o que recebemos nele, também o devemos realizar em nossa vida, reviver a morte de Cristo no “sim” a Deus, reviver sua ressurreição na “verificação” do seu amor que em nós se manifesta.
Mateus 28, 1-10: As mulheres ao sepulcro: mensagem do anjo e aparição de Cristo – Não houve testemunhas para ver Jesus sair do sepulcro. Mesmo os soldados ao sepulcro (mencionados só por Mt 27,62-66;28,11-15) não são testemunhas do fato físico, mas antes da má vontade do mundo, que pretende encobrir glória do Cristo. O importante, na narração da manhã pascal, são as palavras do anjo (28,5-7) e de Cristo mesmo: o que morrera, vive, e reúne seus irmãos. Ele reassume se rebanho, não só o da Galiléia naqueles dias, mas de todo o mundo e todo o tempo.
A morte de cruz mergulhou os discípulos numa profunda desolação. Os ideais cultivados na convivência com o Mestre esvaíram-se. Seu poder, sobejamente demonstrado nos milagres que realizou, diluiu-se na impotência a que fora reduzido ao ser pregado na cruz, sem ter como se defender. Sua autoridade, manifestada no modo de falar e ensinar, pareceu desacreditada, ao ser Jesus reduzido à condição de maldito. Sua intimidade com o Pai pareceu ter sido de pouca valia, pois não se observou nenhuma manifestação divina a seu favor, quando se viu entregue nas mãos de seus algozes. O projeto de Reino, formidável na sua formulação, foi de água abaixo. Era insensato falar de justiça, fraternidade, partilha, num mundo onde o pecado brutalizara o coração humano, e a injustiça, a maldade e a prepotência pareciam ter a primazia.
A desolação impedia os discípulos de considerar com clareza a morte de Jesus e de entendê-la em conexão com sua vida. O olhar obnubilado impedia-os de pensar diversamente e de considerar a possibilidade da intervenção do Pai na vida de Jesus. Afinal, não mostrara-se o Filho, de mil maneiras, absolutamente fiel a ele?
A ressurreição abriu os olhos dos discípulos, permitindo-lhes reinterpretar a morte de Jesus sob nova luz. Então, o humanamente insensato tomou um sentido novo, na perspectiva de Deus. Por isso, urgia não se deixar abater pela desolação, mas olhar para além da cruz.